A vida moderna é uma corrida contra o tempo. Entre metas e tarefas, muitas vezes deixamos de viver o presente. Falta energia, falta planejamento, falta espaço. Mas, e se faltar você?
Esse é um medo silencioso de muitas mães: o de “faltarem” aos seus filhos, seja por ausência física ou emocional. A maternidade ainda carrega um peso social construído sobre a ideia de renúncia e sacrifício. E isso precisa ser questionado.
A cobrança pela maternidade perfeita
É inevitável pensar nas vidas dos nossos filhos à luz das nossas próprias escolhas. Será que estou fazendo tudo o que posso? Lembro de me fazer essa pergunta quando a Beatrice ainda estava na minha barriga. Mesmo dando tudo de si, muitas mulheres carregam a culpa de não serem suficientes.
A psicóloga Caroline Ferreira, que acompanha mulheres em diferentes fases da maternidade, defende uma maternidade que respeita a realidade de cada mulher.
“Nunca falam para a mulher o que é o puerpério. Falam sobre o bebê, mas não sobre o que ela vai sentir. A maternidade não precisa ser perfeita, ela tem que ser possível. ”
O peso da renúncia
Equilibrar múltiplas jornadas, como a maternidade, a vida profissional, os relacionamentos e as tarefas domésticas, não deveria ser tratado como símbolo de vitória. Não há glória em se anular para dar conta de tudo. E, por favor, evite frases como: “Você tem mais jeito para isso.”
Saber cuidar é resultado de esforço, aprendizado e divisão de responsabilidades.
“Historicamente, foi construída a ideia de que a mulher precisa abdicar de si para ser uma boa mãe. Caso contrário, será vista como egoísta. Mas hoje, com mais acesso à informação, falamos de uma mulher que não precisa se perder de si mesma. Ela pode, sim, desejar uma carreira, um projeto pessoal, uma noite com as amigas”, destaca Caroline.
A vida após a maternidade
É comum ouvir mães dizerem que, depois da maternidade, a vida se tornou mais “finita”. Atravessar a rua causa medo. Esportes radicais são evitados. O pensamento “tem alguém que depende de mim” passa a determinar o ritmo da vida. Caroline cita a teoria do psicanalista Donald Winnicott, criador do conceito de “mãe suficientemente boa”:
“É aquela que erra, falha, se percebe e tem condições de reparar. Essa mãe vai se tornando, gradualmente, menos necessária. Ela permite que a criança se frustre e não atende a todas as suas demandas. É uma mãe real, que também deseja outras coisas além da maternidade.”
Fragilidades, traumas e julgamentos
A maternidade expõe nossas vulnerabilidades. É uma nova vida, sim — mas também é uma nova mulher. E ainda preciso provar para mim e para os outros que consigo dar conta da rotina materna. Como encontrar equilíbrio nessa construção de identidade? O primeiro passo é reconhecer sua individualidade, como lembra Caroline:
“A maternidade é um pacto com a imperfeição e com a flexibilidade. Você planeja e, na hora, tudo acontece diferente.”
A mulher além da mãe
Que tipo de mãe eu sou? Depois de quase seis anos mergulhada na maternidade, entendi que só eu conheço a minha realidade. O julgamento do outro não pode limitar minhas escolhas. E, segundo Caroline, a busca pela perfeição pode ser um caminho perigoso:
“Crianças e adolescentes não precisam de mães perfeitas, precisam de mulheres inteiras. De que adianta ser mãe e estar frustrada, repetindo para o filho: ‘Abri mão dos meus sonhos por você’? Isso pode ser mais danoso do que dizer: ‘Eu escolho ser mãe, mas também escolho outras coisas para mim.”
A invisibilidade materna
O trabalho de cuidado, a ausência nas fotos de família, a dificuldade de equilibrar todas as funções — tudo isso revela a dura realidade enfrentada por mulheres que são mães. A sociedade continuará dizendo que você não é boa o suficiente. Mas carregar essa culpa não é justo, principalmente para quem se doa tanto. Sobre os impactos dessa maternidade na vida dos filhos, a psicóloga Caroline Ferreira faz referência à psicanalista Ana Suy, que lança um olhar direto e honesto sobre a complexidade da experiência materna:
“Se você não quer traumatizar um filho, não tenha. Porque ser mãe é uma aposta. Somos marcados por experiências boas e traumáticas. Não há como controlar como essas experiências vão impactar cada pessoa.”
Maternidade não é competição
A maternidade não deve ser uma disputa por quem faz mais ou melhor. Homens, mulheres e toda a rede de apoio têm papéis fundamentais. Ajudar não é favor, é corresponsabilidade. Afinal, maternar exige presença efetiva, não apenas ajuda ocasional.